sexta-feira, 13 de janeiro de 2017

O que é a Verdade? – o testemunho do ex-pastor protestante Marcus Grodi


Nosso apostolado publica agora, – com exclusividade no Brasil, – o testemunho completo (versão integral) do ex-pastor norte-americano Marcus C. Grodi, no qual relata o seu processo de conversão à Igreja Católica. Grodi é o fundador e presidente da organização “The Coming Home Network” e apresentador do programa semanal “The Journey Home”, que é transmitido pela EWTN (a maior rede de comunicação religiosa do mundo). O site "O Fiel Católico" foi escolhido, como referência de pesquisa sobre a Igreja Católica na internet, para a divulgação do texto estendido da história de sua conversão. A tradução é de Elton Netto, e a publicação do texto está devidamente autorizada pela assessoria de Marcus Grodi. Por ser extenso, publicaremos o texto em duas partes, a primeira das quais segue abaixo.

SOU UM EX-PASTOR protestante. Como muitos outros que trilharam o caminho que leva a Roma via o território conhecido como protestantismo, eu nunca imaginei que um dia me converteria ao catolicismo.

Pelo temperamento e treinamento, sou mais pastor que estudioso. Então minha história de conversão para a Igreja Católica talvez não tenha os detalhes técnicos nos quais teólogos trafegam e com os quais alguns leitores se encantam. Mas espero que eu consiga explicar de forma precisa por que fiz o que fiz, e por que acredito de todo o meu coração que todos os protestantes deveriam fazer o mesmo. Não irei me ater aos detalhes dos meus primeiros anos, limitando-me a dizer apenas que fui criado por pais maravilhosos em um lar protestante. Vivi a maioria das experiências da infância e da adolescência de um típico “baby-boomer” (geração nascida entre 1946 e 1963).

Fui ensinado a amar Jesus e ir para igreja no domingo. Cometia também a maioria dos erros tolos que outras crianças da minha geração cometiam. Mas, depois de um período de rebeldia da adolescência, quando tinha 20 anos de idade, experimentei uma reconversão radical para Jesus Cristo. Mudei minha atenção, que estava até então voltada às seduções do mundo, para me tornar uma pessoa seriamente dedicada às orações e ao estudo da Bíblia.
Como jovem adulto, renovei meu compromisso com Cristo, aceitando-O como meu Senhor e Salvador, orando para que Ele pudesse me ajudar a realizar a missão em vida que Ele havia escolhido para mim. Quanto mais eu procurava orar e estudar para seguir Jesus e moldar minha vida para Ele, mais eu sentia o desejo ardente de dedicar minha vida totalmente para servi-Lo. Gradualmente, de forma semelhante aos primeiros raios do sol que preenchem o horizonte escuro, a convicção de que o Senhor estava me chamando para me tornar pastor começou a surgir.
Essa convicção aumentava continuamente enquanto eu estava na faculdade e em seguida durante meu trabalho como engenheiro. Até que finalmente não pude mais ignorar o chamado. Eu estava convencido de que o Senhor queria que eu me tornasse um pastor, então deixei meu emprego e me matriculei no seminário teológico de Gordon-Conwell, nos arredores de Boston. Formei-me em Teologia e logo em seguida fui ordenado ministro protestante. Meu filho de seis anos de idade, Jon-Marc, recentemente memorizou o juramento de Lobinho (fase iniciante para se tornar escoteiro), que diz: “Eu ..... prometo fazer o meu melhor para realizar o meu dever para com Deus e para com meu país”. Essa promessa séria na juventude mais nitidamente expressa a importância da minha razão de desistir da minha carreira de engenheiro para servir, com essa atitude de abandono, inteiramente ao Senhor, exercendo o ministério em tempo integral.

Assumi meus deveres como pastor com seriedade, e queria executá-los corretamente e fielmente. Então, quando estivesse no final da minha vida, face a Face com Deus, eu poderia escutá-Lo dizer estas palavras muito importantes: “Muito bem, bom e fiel servidor” (Mt 25,21). Exercendo essa prazerosa vida de pastor protestante, sentia-me feliz e em paz comigo e com Deus. – Finalmente senti que havia chegado ao fim de uma jornada.

Eu não havia chegado

Em pouco tempo me deparei com um grande número de confusões teológicas e questões administrativas. Existiam dilemas exegéticos sobre como interpretar corretamente passagens bíblicas difíceis, bem como decisões litúrgicas difíceis que poderiam dividir a congregação. Meus estudos no seminário não haviam me preparado adequadamente para tratar de tamanha complexidade de opções.
Eu simplesmente gostaria de ser um bom pastor. Porém, não conseguia encontrar para minhas questões respostas consistentes nem por meio dos meus colegas ministros, nem dos livros “como fazer” disponíveis na minha estante, nem dos líderes da minha denominação presbiteriana. Parecia ser normal que cada pastor tivesse suas próprias ideias sobre essas questões.
Essa mentalidade de “reinventar a roda toda vez que você precisar”, que é o coração da prática pastoral do protestantismo, estava me perturbando profundamente. “Por que eu precisaria ter que reinventar a roda?”, fiz essa pergunta a mim mesmo aborrecidamente. “O que teria acontecido com ministros cristãos dos séculos anteriores que passaram por essas mesmas questões? O que eles fizeram?”.

Nós fomos ensinados no seminário a enxergarmos o “triunfo” da Reforma sobre o “romanismo” como a emancipação do protestantismo sobre as leis e dogmas e costumes “artificialmente estabelecidos” por Roma que “acorrentaram” os cristãos por séculos. No entanto essa “emancipação” começou a parecer muito mais uma anarquia do que uma liberdade verdadeira.
Eu não obtive as respostas que precisava, ainda que orasse constantemente pedindo por orientação. Senti que meus recursos haviam se esgotado e não sabia para onde ir. Ironicamente, essa sensação de frustração por não ter respostas foi providencial. Isso me fez ficar aberto para as respostas oferecidas pela Igreja Católica. Tenho certeza de que se tivesse a sensação de ter todas as respostas, eu não teria tido a capacidade ou a disposição para investigar as coisas com maior nível de profundidade.

Uma brecha em minha defesa

No mundo antigo, cidades eram construídas nos topos dos morros e circundadas por fortes muralhas que protegiam os habitantes contra invasores. Quando tropas invasoras sitiavam a cidade (por exemplo, quando o exército de Nabucodonosor sitiou Jerusalém (2 Reis 25,1-7), os habitantes estavam salvos enquanto houvesse alimento e água e as muralhas pudessem resistir aos ataques realizados, por exemplo, por meio de catapultas. Porém, se surgisse alguma brecha na muralha, a cidade estaria perdida.
Minha disposição em considerar os ensinamentos da Igreja Católica teve início como resultado de uma brecha na muralha da teologia da reforma protestante que envolvia a minha alma. Por aproximadamente 40 anos trabalhei para construir aquela muralha, pedra sobre pedra, para proteger minhas convicções protestantes. As pedras foram formadas a partir das minhas experiências pessoais, da formação no seminário, dos relacionamentos, e sucessos e fracassos no ministério. A argamassa que firmou as pedras no lugar foram minha fé e minha filosofia protestantes. Minha muralha era alta, espessa e impenetrável, pensei.
Eu comecei a ficar preocupado. A argamassa ficou fraca, as pedras começaram a se mover e deslizar, no início imperceptivelmente, mas depois com uma velocidade alarmante. Tentei com empenho discernir a razão da minha crescente falta de confiança na doutrina protestante. Não estava certo sobre o que eu estava procurando para substituir minhas crenças calvinistas. Porém, eu sabia que minha teologia não era invencível. Li mais livros e consultei teólogos no esforço de remendar a muralha, mas não obtinha qualquer êxito.

Refleti bastante sobre Provérbios 3,5-6: “Confia no Senhor com todo o teu coração, não te fies em tua própria inteligência; em todos os seus caminhos reconhece-O, e Ele endireitará as tuas veredas”. Essa exortação tanto me assombrava quanto me consolava, enquanto tentava tratar das confusões doutrinais e do caos procedural dentro do protestantismo.
Os Reformadores tinham defendido a ideia da interpretação pessoal, individualizada, da Bíblia. Eu comecei a me sentir cada vez mais incomodado com aquela passagem em Provérbios 3,5-6. Protestantes crentes na Bíblia afirmam que eles de fato seguem os ensinamentos nessa passagem ao buscarem a orientação do Senhor. O problema é que os protestantes sentem que o Senhor os está orientando a transitar por milhares de diferentes caminhos de doutrina. E essas doutrinas diferem enormemente entre elas dependendo da denominação protestante.

Eu me debatia com várias perguntas: como posso saber qual vontade de Deus é aplicável para minha vida e para as pessoas da minha congregação? Como posso saber que o que estou pregando está correto? Como posso saber qual é a verdade?

Na luz da confusão acompanhada da desordem doutrinal que existe dentro do protestantismo, – cada denominação baseando o seu posicionamento doutrinal na pessoa que fundou aquela denominação, – o ostentador padrão protestante “eu acredito somente no que a Bíblia diz” começa a soar não verdadeiro. Segui a crença protestante de “somente a Bíblia” para determinar a verdade, mas as doutrinas originárias da Reforma Protestante que eu herdei de João Calvino, João Knox e dos puritanos eram bastante diferentes em muitos aspectos em relação àquelas defendidas por amigos luteranos, batistas e anglicanos.
Nos Evangelhos, Jesus explica o que significa ser um discípulo verdadeiro (veja Mt 19,16-23). É mais do que ler a Bíblia ou ter o seu nome na lista de membros de uma igreja ou regularmente estar presente nos cultos dominicais, ou mesmo fazer uma oração de conversão para aceitar Jesus como o Senhor e Salvador. Essas coisas, apesar de serem boas, isoladamente não nos tornam discípulos de Jesus. Ser discípulo de Jesus Cristo significa fazer um compromisso radical de amor e obediência ao Senhor em cada palavra, ação e atitude, buscando irradiar o amor Dele nos outros. O verdadeiro discípulo, Jesus disse, está disposto a desistir de tudo, até mesmo da própria vida se necessário, para seguir o Senhor.
Eu estava totalmente convencido dessa ideia. Da mesma forma que tentava colocar isso em prática (nem sempre com muito sucesso), fiz meu melhor para convencer minha congregação que aquele chamado para o discipulado não é uma opção, mas sim algo para o qual cristãos são chamados a se esforçar intensamente a realizar. A ironia foi que minha teologia protestante me fez impotente para chamá-los a um discipulado radical, e essa mesma teologia os tornou impotentes para escutar esse chamado e prestar atenção nele.
Alguém pode perguntar: “Se tudo o que é necessário para ser salvo é confessar com tua boca que Jesus é o Senhor e crer em seu coração que Deus o ressuscitou dentre os mortos (Rom 10,9), então por que eu devo mudar? Oh, com certeza, eu devo mudar meus caminhos de pecador. Eu devo me esforçar para agradar a Deus. Porém, se eu não o fizer, o que importa? Minha salvação está assegurada”.

Um repórter de um jornal da cidade de Nova Iorque, – então a história segue, – queria escrever um artigo sobre qual invenção as pessoas consideravam a mais surpreendente do século vinte. Ele foi às ruas, entrevistando pessoas aleatoriamente, e recebeu uma variedade de respostas: o avião, o telefone, o automóvel, o computador, a energia nuclear, a viagem espacial e os antibióticos. As respostas seguiram essa linha até que uma pessoa deu uma resposta incomum. “É óbvio”, ele falou, “a invenção mais surpreendente foi a garrafa térmica”. “A garrafa térmica?”, perguntou o repórter, com as sobrancelhas levantadas. “É claro. Ela mantém as coisas quentes aquecidas e as frias resfriadas”. O repórter, demonstrando surpresa: “e daí?” – “Bem, como saber qual é realmente a invenção mais surpreendente?”...
Essa anedota teve um significado especial para mim. Já que era minha tarefa e meu dever ensinar a Verdade de Jesus Cristo para minha congregação, minha crescente preocupação era simples: “Como eu sei o que é e o que não é a Verdade?”.

Todo domingo eu ficava no meu púlpito e interpretava as escrituras para a minha assembleia, sabendo que em um raio de 25 km da minha igreja existiam dezenas de outros pastores protestantes. Todos eles acreditavam que somente a Bíblia era a única autoridade para a doutrina e a prática, ainda que cada um deles estivesse ensinando alguma coisa diferente do que eu ensinava. Estaria a minha interpretação das Escrituras correta ou não? Eu pensava... Talvez algum desses outros pastores esteja certo, e eu esteja guiando erradamente esse povo que acredita em mim. Eu também tinha a compreensão – não, a aterrorizante certeza – de que um dia eu morreria e me apresentaria diante do Senhor Jesus Cristo, o Juiz Eterno. Eu seria solicitado a responder como liderei as pessoas que Ele me entregou para pastorear.

“Estou pregando a verdade ou o erro?”, eu perguntava a Deus repetidamente. “Eu acho que estou certo, mas como posso ter certeza?”. Esse dilema me atormentava frequentemente. Comecei a questionar cada aspecto do meu ministério e da teologia proveniente da Reforma Protestante, desde as questões insignificantes até às mais importantes. Olho para trás agora com perplexo humor; como eu me inquietava durante aqueles dias difíceis de incerteza.

Cheguei até a ficar em dúvida sobre vestir ou não o colarinho clerical. Ministros presbiterianos não possuem um código de vestimenta clerical. Alguns vestem colarinhos; alguns, terno de negócios; alguns, toga; outros, uma combinação de tudo. Um amigo pastor mantinha o colarinho clerical no porta-luvas do carro, na expectativa de trazer de alguma forma vantagem para ele ao colocá-lo. “Algo como dar uma desculpa para evitar uma multa por excesso de velocidade”, ele confidenciou uma vez com um largo sorriso conspirador. Por fim eu decidi não usar o colarinho clerical. No culto de domingo, vesti uma toga preta, utilizada pelo coral, por cima do meu terno.
Sobre o formato e o conteúdo da liturgia de domingo, cada igreja tinha sua própria visão sobre como as coisas deveriam ser feitas, e cada pastor era livre para fazer quase tudo que ele quisesse dentro dos limites do que era aceitável e possível. Sem normas estabelecidas pela denominação religiosa para me orientar, eu fazia o que todos os outros pastores faziam: improvisava. Hinos, sermões, escolha das passagens da Escritura, participação da congregação, administração do Batismo, casamento e a Ceia do Senhor eram todas partes da liturgia nas quais me sentia livre para realizar experimentos. Eu me arrepio com a lembrança de um domingo em particular, quando no esforço de tornar mais interessante e “relevante” a participação dos jovens, falei as palavras de consagração do Senhor, “Este é o Meu Corpo, este é o Meu Sangue, fazei isto em memória de Mim”, utilizando um jarro de refrigerante e uma tigela de batatas fritas.
Questões teológicas eram o que mais me aborrecia. Lembro-me de estar em um hospital ao lado da cama onde um homem estava próximo de morrer, após sofrer um ataque cardíaco. Sua esposa extremamente preocupada me perguntou: “meu marido irá para o Paraíso?”. Eu hesitei por um momento antes de dar minha memorizada resposta presbiteriana. Considerei a grande diversidade de respostas alternativas que poderia dar, dependendo se quem perguntava era metodista, batista, luterano, da assembleia de Deus, nazareno, cientista cristão, do evangelho quadrangular, testemunha de Jeová ou qualquer outra denominação. Tudo o que eu podia fazer era falar, da boca para fora, um conjunto de palavras piedosas, porém, vagas, “nós devemos confiar no Senhor”, com a intenção de fazê-la se sentir menos preocupada sobre a salvação do marido. Ela talvez tenha sido confortada, mas a pergunta dela, emocionada e repleta de lágrimas, atormentou-me. Afinal, como um pastor, seguidor da reforma protestante, eu acreditava nas doutrinas calvinistas da predestinação e na perseverança dos santos. Esse homem entregou sua vida a Cristo, estava regenerado e confiante de que era um dos eleitos por Deus. Porém, ele realmente era?
Eu estava profundamente preocupado por saber que não importa quão sério ele tivesse pensado que era predestinado ao Paraíso (é interessante que aproximadamente todos que pregam a doutrina da predestinação acreditem firmemente que eles próprios fazem parte dos eleitos), e não importa quão sinceramente aqueles ao redor dele acreditam que ele tenha sido, ele poderá não ter ido para o Paraíso.
O que aconteceria se ele secretamente “tivesse uma recaída” cometendo pecado grave e vivendo em um estado de rebelião contra Deus no momento em que o ataque cardíaco o pegou de surpresa? A teologia da reforma protestante me disse que se esse fosse o caso, então a pobre pessoa foi simplesmente enganada por uma falsa segurança, pensando que ele estava regenerado e predestinado para o Paraíso, quando de fato ele não havia sido regenerado ao longo de sua vida e estava na verdade em sua caminhada para o inferno. Calvino ensinou que os eleitos do Senhor irão, – obrigatoriamente, – perseverar na Graça e eleição. Se uma pessoa morre em estado de rebelião contra Deus, ele prova que jamais foi um dos eleitos. Que tipo de certeza absoluta é essa? Eu me perguntei.

Achei difícil dar claras e confiáveis respostas para perguntas que minha comunidade eclesial me fazia, como por exemplo: “Meu marido irá para o paraíso?”. Todo pastor protestante que eu conheci tinha um conjunto diferente de critérios que ele listava como “necessários” para a salvação. Como calvinista, eu acreditava que se alguém publicamente aceitava Jesus como seu Senhor e Salvador, ele estava salvo pela Graça através da fé. Porém, mesmo consolando outros com essas palavras que soavam bem, incomodava-me o estilo de vida mundano e algumas vezes extremamente pecaminoso desses agora falecidos membros da minha congregação.
Após alguns poucos anos de ministério, eu comecei a ter dúvidas se deveria continuar.
Contemplando os pardais
Levantei-me numa manhã antes do alvorecer e, pegando uma cadeira dobradiça, meu jornal e uma Bíblia, saí para um campo silencioso próximo da minha igreja. Era o período do dia que mais gostava, quando os pássaros estão cantando o despertar do mundo.
Frequentemente me admiro com a exuberância dos pássaros no início da manhã. Quão admiravelmente curtas memórias eles têm! Iniciam cada dia de suas simples existências com uma sinfonia de louvor para o Senhor que os criou, completamente desprendidos de preocupações ou planos. Algumas vezes eu “contemplava os pardais” e meditava sobre a simplicidade de suas vidas.
Sentando silenciosamente no meio de um campo coberto de orvalho, aguardando o sol aparecer, eu lia as Escrituras e meditava sobre as questões que me atormentavam, colocando minhas preocupações diante do Senhor. A Bíblia me alertou a não “confiar em (meu) próprio discernimento”, então estava determinado a confiar em Deus para me guiar. Eu estava imaginando deixar a função de pastor e visualizava três opções. Uma era me tornar o líder de um ministério jovem de uma igreja presbiteriana grande que havia me oferecido essa posição. Outra era deixar todo o ministério e voltar para a engenharia. A outra possibilidade seria retornar para a escola e aprimorar minha qualificação científica em uma área que pudesse abrir profissionalmente ainda mais as portas para mim: eu havia sido aceito em um programa de biologia molecular na Universidade do Estado de Ohio.
Pensei por muito tempo sobre essas opções, pedindo a Deus que guiasse meus passos. Uma voz audível seria ótimo, eu pensei, sorrindo, enquanto fechava meus olhos e esperava pela resposta do Senhor. Não fazia ideia de que forma A Resposta viria, mas não demorou muito para vir.
Meu devaneio terminou abruptamente quando um pardal cantando alegremente voou sobre mim e seu excremento atingiu a minha cabeça! “O que está me dizendo, Senhor?”, eu clamei com angústia por aquele Trabalho. A cantoria dos pássaros foi a única resposta. Não houve Voz vinda do Céu (nem sequer uma risada), mas somente os sons da natureza acordando do sono aquela região de Ohio.
Aquilo teria sido um sinal divino ou meramente um comentário no editorial do irmão pássaro sobre minhas preocupações? Com desgosto fechei minha cadeira, peguei minha Bíblia e fui para casa. Mais tarde, naquele dia, quando contei à minha esposa, Marilyn, sobre as três opções que eu estava considerando e o incidente sujo com o pássaro, ela riu e exclamou com sua típica sabedoria: “O significado é claro, Marcus: Deus está dizendo 'nenhuma das opções acima!'”.

Embora preferisse um método menos humilhante de comunicação, eu sabia que nada ocorre acidentalmente, e que nem os pardais, nem o que eles deixaram cair na Terra, ocorrem sem o conhecimento de Deus. Considerei isso pelo menos como uma dica cômica dada por Deus para eu permanecer no ministério. Porém, ainda sabia que minha situação não estava endireitada. Talvez eu precisasse de uma igreja maior, com mais verba e com mais assistentes. Certamente, então, eu estaria feliz. Assim, parti em direção de “a igreja maior é melhor”, pensando que satisfaria meu coração inquieto.
Em seis meses eu encontrei uma que gostei, e na qual o grande número de congregados parecia ter gostado de mim também. Eles me ofereceram uma posição de pastor sênior, com assessores e uma verba dez vezes superior a da minha igreja anterior. Melhor de tudo, essa era uma igreja evangélica robusta, com muitos membros, que eram ativamente interessados no estudo da Escritura e no ministério de leigos. Eu apreciava pregar diante dessa grande e, em grande parte, aprovadora congregação a cada domingo. Inicialmente pensei que tivesse resolvido o meu problema. Mas após somente um mês percebi que maior não significava melhor. Minha frustração simplesmente cresceu proporcionalmente. 

Sorrisos educados se apresentavam para mim durante cada sermão. Porém, eu não estava cego para o fato de que para muitos na congregação as minhas exortações apaixonadas sobre viver uma vida virtuosa simplesmente moviam-se rapidamente de um lado para o outro pela camada superficial da religiosidade como uma pequena gota de água sobre uma frigideira quente. Muitos diziam: “Ótimo sermão! Ele realmente foi uma benção para mim!”. Entretanto, parecia óbvio que eles quiseram dizer na realidade: “Aquele sermão é bom para as outras pessoas, pastor, – para os pecadores, – mas eu já alcancei a salvação. Meu nome já está na lista dos que irão para o Paraíso. Eu não preciso me preocupar com todas essas coisas, mas certamente concordo com você, pastor, que devemos falar a todos os pecadores para se endireitarem com Deus”.
Certo dia me encontrei diante do presbitério local como um porta-voz de um grupo de pastores e leigos que estavam defendendo a ideia de que ao usarmos a língua paterna para Deus numa oração pública, nós devemos chama-Lo “Pai”, não “Mãe”. Defendi essa posição apelando para a Escritura e a tradição cristã. Para meu espanto, percebi que o grupo que eu representava era minoria e que estávamos lutando em uma batalha perdida. Essa questão não seria solucionada por algum argumento claro que considerasse cuidadosamente a Escritura ou a história da igreja, mas sim por uma votação – a maioria dos votos sendo pró-linguagem-gênero-neutro liberal. Foi nessa reunião que reconheci pela primeira vez o princípio anárquico em que se encontra centrado o protestantismo.
Esses liberais (gravemente errados nos seus planos de reduzir Deus a uma mera função de “criador, redentor e santificador” ao invés de considerarem as Pessoas do Pai, do Filho e do Espírito Santo) estavam sendo simplesmente bons protestantes. Eles estavam simplesmente seguindo o curso do protesto idealizado para eles por seus antecessores Martinho Lutero, João Calvino e outros reformadores. A máxima (o princípio) da reforma de “eu não aceitarei um ensinamento a menos que eu acredite que ele esteja correto e seja bíblico” foi sendo invocado por esses liberais protestantes em favor de seus protestos contra o nome masculino para se referir a Deus. Subitamente reparei que eu estava observando o protestantismo na plena glória da doutrina egocêntrica do seu habitat natural: o protesto. “Em que tipo de igreja eu estou?”. Perguntei a mim mesmo, desapontado com a votação realizada e com o meu grupo derrotado.
Sobre este período, minha esposa, Marilyn, que estava sendo diretora de um centro pró-vida de crise de gravidez, passou a me questionar a respeito da inconsistência entre nossas firmes convicções pró-vida e a postura pró-escolha da nossa denominação protestante. “Como você pode ser ministro de uma denominação que aprova o assassinato de bebês que estavam por nascer?”, ela me perguntou. A liderança da minha denominação protestante havia se curvado perante a pressão de feministas radicais, homossexuais, pró-aborto e outros grupos extremistas pertencentes àquela denominação. Não obstante, aparentemente, para que membros de determinadas congregações pudessem se manter pró-vida e também com outros pontos de vista tradicionais, estes membros impuseram normas liberais rigorosas como critério para contratação de novos pastores. Quando Marilyn me despertou para o fato de que uma parcela das contribuições da minha congregação para a Assembleia Geral Presbiteriana era muito provavelmente para pagar abortos, – e não havia nada que eu ou minha congregação pudesse fazer a respeito, – fiquei chocado.

Marilyn e eu sabíamos que tínhamos que deixar essa denominação, mas para aonde iríamos? Essa pergunta me levou a outra: onde eu encontraria um emprego como pastor? Comprei um livro que listava detalhes de todas as principais denominações cristãs e comecei a avaliar muitas das que me interessavam. Eu lia os resumos doutrinais e pensava: essa denominação é legal, mas não gosto do ponto de vista deles sobre o Batismo. Essa aqui está "ok", mas o ponto de vista deles sobre o final dos tempos é exageradamente aterrorizador. Essa soa exatamente do jeito como estou procurando, mas me sinto desconfortável com o estilo deles realizarem adoração.

Após examinar todas as possibilidades e não encontrar nenhuma que eu gostasse, fechei o livro me sentindo frustrado. Eu sabia que estava deixando o presbiterianismo, mas não tinha ideia de qual denominação era a “certa” para me unir. Parecia-me que cada uma delas tinha algo de errado. “Muito ruim, eu não posso customizar minha igreja perfeita”, pensei comigo tristonhamente. Durante essa época, um amigo de Illinois me telefonou. Ele também era um pastor presbiteriano, e havia escutado um rumor de que eu estava planejando deixar a denominação presbiteriana. “Marc, você não pode deixar a igreja!”, ele me repreendeu. “Você nunca deve deixar a igreja; você está comprometido com a igreja. Não importa se alguns teólogos e pastores são excêntricos. Nós temos que permanecer com a igreja e trabalhar pela renovação com as pessoas que pertencem a ela! Nós temos que preservar a unidade a todo custo!”. “Se isso é verdade”, eu respondi aborrecidamente, “por que nós protestantes nos separamos primeiramente da Igreja Católica?”.
Não sei de onde saíram aquelas palavras. Nunca em minha vida tive sequer um pensamento passageiro sobre os reformistas estarem ou não corretos por terem deixado de fazer parte da Igreja Católica por discordar dela. Essa era a natureza fundamental do protestantismo: tentar trazer renovação por meio de divisão e fragmentação. O lema do presbiterianismo é “Reformada e sempre reformando”. (Dever-se-ia acrescentar: 'e reformando, e reformando, e reformando, e reformando...').

Eu poderia ir para outra denominação, sabendo que mais tarde possivelmente mudaria para outra, quando me tornasse insatisfeito; ou eu poderia decidir permanecer onde estava, convivendo com todos aqueles problemas. Mas então, como eu poderia justificar minha permanência onde estava? Por que eu não deveria retornar para o grupo da denominação anterior da qual nós, presbiterianos, desafiadoramente nos separamos por discordarmos dela? Nenhuma dessas opções me parecia correta, então decidi que deixaria o ministério até resolver a questão de alguma forma.
Retornar para a escola parecia a forma mais fácil para pegar um fôlego diante de tudo isso. Então eu me matriculei em um programa de pós-graduação em biologia molecular na Universidade Case Western Reserve. Minha meta era combinar meus conhecimentos científicos e teológicos em uma carreira de bioética. Eu esperava que um doutorado em biologia molecular me desse uma melhor condição entre os cientistas que uma graduação em Teologia ou ética.
As idas até o campus de Cleveland me tomavam uma hora. Então, durante os oito meses seguintes eu tive bastante período de silêncio para introspeção e para oração. Logo fiquei profundamente imerso em um projeto de pesquisa em engenharia genética, o qual envolvia a remoção e a reprodução de DNA humano retirado de rins homogeneizados. O programa era bastante desafiador, mas eu amava isso. Ainda assim, comparando com a complexidade dos aminoácidos e dos ciclos de bioquímica, debater-me com as conjugações latinas e declinações alemãs parecia ser bem mais fácil. – O projeto me fascinava e também me assustava. Eu sentia prazer com o estimulo intelectual da pesquisa científica. Porém, também via quão desumanizante poderia ser a pesquisa no laboratório. Tecido genético, colhido de cadáveres de pacientes mortos na Clínica de Cleveland, era enviado para nosso laboratório para pesquisa de DNA. Eu me sentia profundamente comovido pelo fato desses tecidos terem vindo de pessoas, – mães e pais, crianças e avós, – que tinham vivido, trabalhado, sorrido e amado. Dentro do laboratório, esses numerosos e organizados frascos de tecido eram simplesmente tubos de “coisas”, material “experimental” que era completamente dissociado da pessoa humana a quem pertenceu algum dia.
Escrevi um artigo sobre os problemas éticos relacionados com transplante de tecido fetal e comecei a falar para grupos cristãos sobre os perigos e as virtudes da tecnologia biológica moderna. As coisas pareciam caminhar conforme o plano – pelo menos até eu perceber que minha verdadeira razão para voltar à escola não era me graduar. Foi até o dia que comprei um exemplar do jornal local de Cleveland.
Em uma manhã de sexta-feira, após dirigir por muito tempo até Cleveland, estava tomando meu café da manhã e matando tempo antes da aula, tentando me manter acordado. Normalmente eu estaria utilizando meu tempo para estudar um pouco, mas naquela manhã fiz algo não usual: comprei um exemplar do jornal "The Plain Dealer". Coloquei os vinte e cinco centavos de dólar na máquina de venda de jornais. Eu não tinha como saber que estava chegando num ponto de bifurcação da Estrada. Estava para enveredar por um caminho que me levaria para fora do protestantismo (suponho que se tivesse sabido a priori para onde isso me levaria, teria corrido para outro caminho). Passando os olhos com pouco interesse, deparei-me com um pequeno anúncio que me chamou a atenção: “O teólogo católico Scott Hahn falará na paróquia católica local neste domingo à tarde”.
Fiquei extremamente surpreso: “Teólogo católico Scott Hahn?”. Não poderia ser o Scott Hahn que eu conheci! Frequentamos juntos, no início dos anos 80, o seminário teológico Gordon-Conwell. Naquela época ele era um calvinista anticatólico convicto, o mais convicto do campus. Estive participando superficialmente de um intenso grupo de estudo calvinista liderado pelo Scott. Mas enquanto o Scott e outros passavam horas investigando a Bíblia como detetives, tentando desvendar cada ângulo de cada implicação teológica, eu jogava basquete.
Ainda que não visse o Scott desde sua graduação em 1982, escutei um rumor negro acerca de ele ter se tornado católico. Eu não havia pensado muito sobre isso. Ou o rumor era falso, inventado por alguém que se sentiu ofendido pela (ou que sentiu inveja da) intensidade das convicções do Scott, ou então o Scott mudou. Decidi fazer a viagem de uma hora e meia para descobrir. Eu estava completamente despreparado para o que viria a descobrir.

** Leia a segunda e conclusiva parte deste depoimento
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Marcus Grodi é o fundador e presidente do 'The Coming Home Network International'. Ele frequentemente profere palestras e é o anfitrião dos programas da EWTN (www.ewtn.com/) veiculados duas vezes por semana: 'The Journey Home' (televisão) e 'Deep in Scripture' (rádio). Escreve para vários periódicos católicos e é autor dos livros 'How Firm a Foundation' (CHResources, 2002) e 'Thoughts for the Journey Home' (CHResources, 2010). Marcus vive com sua esposa, Marilyn e seus dois filhos mais jovens, Peter e Richard, em uma pequena fazenda próxima de Zanesville, Ohio.
Uma versão anterior dessa estória foi publicada no livro 'Surprised By Truth: 11 Converts Give the Biblica and Historical Reasons for Becoming Catholic' (Patrikc Madrid, ed. Basilica, 1994).
Essa história está publicada no livro 'Journeys Home', editado por Marcus Grodi (CHRresources, ver. Ed. 2011). Para solicitar o livro, clique aqui.
A versão original da história de conversão do Marcus Grodi encontra-se em:
http://chnetwork.org/2011/01/marcus-c-grodi-what-is-truth/
www.ofielcatolico.com.br

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