quinta-feira, 14 de julho de 2011

DOIS MIL ANOS DE CAMINHADA

1. De Jerusalém a Roma
O evangelista Lucas sintetiza com uma frase toda a missão de Jesus: "Eu devo anunciar a Boa Nova do Reino de Deus... Para isso é que fui enviado" (Lc 4,43). Desde os primórdios, a Igreja entende que a missão de evangelizar todos os homens constitui sua missão por excelência. "Evangelizar é, de fato, a graça e a vocação própria da Igreja, a sua mais profunda identidade" (Paulo VI). Os Atos dos Apóstolos - que são a história da Igreja nascente - descrevem a vida cristã como comunidade consolidada pela Palavra e pela Eucaristia, animada intensamente pela vivência dos valores evangélicos, mas também aberta à irradiação da verdade do Evangelho ao mundo inteiro. Da primitiva comunidade de Jerusalém os cristãos se espalham pelas várias regiões do Império Romano, procurando, inicialmente, como ponto de apoio, as comunidades judaicas da diáspora (= "dispersão": núcleos de judeus fora da Palestina, especialmente nas cidades mais importantes do mundo greco-romano). É a comunidade cristã de Antioquia, na Síria, que enviará, pela imposição das mãos, dois de seus membros "em missão" (At 13,2-3). Aos poucos, são fundadas por toda parte pequenas comunidades de cristãos, que vão se estruturando em torno da Palavra e da Eucaristia, dando também origem a uma variedade de ministérios, isto é, serviços vistos como dons do Espírito (carismas) para a construção da comunidade. A alma deste primeiro grande impulso missionário na Igreja é Paulo de Tarso: "Ai de mim se eu não anunciar o Evangelho!" (1 Cor 9,16). De fato, a Boa-nova do Reino segue seu caminho no mundo antigo até chegar à capital do Império: Roma. É lá que as duas colunas do cristianismo, Pedro e Paulo, se encontram, e ambos são martirizados (67).
2. Cristianismo e antiga sociedade pagã
Na época patrística (fim do século I até cerca da metade do século V), a evangelização penetra nos recantos mais remotos do mundo conhecido. De particular importância para o cristianismo é sua expansão no norte da África, com a impressionante figura de Agostinho de Hipona (354-430). Na península itálica destaca-se o grande bispo Ambrósio de Milão (339-397). Realiza-se neste período dos Santos Padres um primeiro sério confronto entre cristianismo e filosofia pagã, no qual Justino (morto por volta do ano de 165) toma parte ativa. No Oriente, os imperadores se interessam vivamente pela religião cristã, chegando a ter papel decisivo na convocação dos primeiros Concílios Ecumênicos (= da Igreja Universal), onde são feitas as primeiras importantes formulações doutrinárias da fé (Nicéia, 325; Constantinopla, 381; Éfeso, 431; Calcedônia, 451). Os hereges, entre eles, de modo particular os arianos, desenvolveram intensa atividade missionária, por exemplo entre os visigodos da região do Danúbio. No decorrer do IV século, o cristianismo ultrapassa os limites do Império Romano, atingindo regiões da Pérsia, Armênia, Arábia e Etiópia.
3. O caminho do Evangelho fora do mundo romano
O cristianismo, inicialmente um fenômeno tipicamente urbano, começa, paulatinamente, a penetrar entre os camponeses (até então fiéis às divindades do paganismo: Paganus = homem do campo, adorador destes deuses). Neste movimento salienta-se o bispo missionário de Tours (centro da atual França), São Martinho (morto em 397), o primeiro santo não mártir! O Papa Gregório Magno enviou, em 596, o abade beneditino, Agostinho (de Cantuária), com 40 companheiros à missão entre os anglo-saxões. A partir da Inglaterra e Irlanda, importante movimento evangelizador atingirá vastas regiões no norte da Europa. Temos aqui as figuras de Vilibrordo, o Apóstolo dos Frisões (norte da atual Holanda) e Bonifácio, o Apóstolo da Alemanha. São eles, junto com muitos outros, os fundadores de numerosos mosteiros e dioceses nestas "terras dos bárbaros". A Migração dos Povos nos séculos V e VI trouxe um tremendo desafio para a Igreja e sua ação evangelizadora: a necessidade de integrar novos valores culturais no cristianismo, e "traduzir" a Boa Nova em termos compreensíveis para povos não-latinos. Todo esse processo foi acompanhado de tensões e rupturas, mas resultou finalmente numa nova síntese que - com o decorrer do tempo - se mostrou extremamente fecunda para o futuro da Igreja.
4. Um cristianismo comprometido com interesses da sociedade civil
A Idade Média (476-1453) caracteriza-se pela consolidação de um regime de cristandade, cujas origens remontam à figura de Constantino, o Grande (Edito de Milão. 313). São reforçados os laços entre os dois poderes: o "espiritual" (papa) e o "temporal" (imperador). A Igreja ocupa lugar de destaque na sociedade, com posição altamente privilegiada. É ela que dita as normas éticas para os povos e seus governantes. Misturam-se interesses puramente "mundanos", de cunho econômico-político, com autênticas aspirações religiosas. Fenômeno típico desta cristandade são as Cruzadas, expedições de caráter militar-religioso para reconquistar a Terra Santa, em poder dos muçulmanos (séculos XI-XIII). A excessiva clericalização da sociedade e a escandalosa mundanização de homens da Igreja provocam reações no seio do próprio cristianismo. Surgem movimentos que buscam maior autenticidade evangélica num espírito de pobreza e simplicidade de vida. Tanto as Ordens Mendicantes (notadamente os dominicanos e franciscanos) como algumas correntes heréticas se situam neste contexto (século XIII).
5. A "Cruz e a espada" conquistam um mundo novo
A grande expansão marítima do século XVI, com a conquista de amplas terras até então desconhecidas na África, Ásia e América, provoca um extraordinário movimento missionário. Espanha e Portugal associam de forma direta a Igreja à sua empresa colonizadora nas regiões ultramarinas. O rei de cada uma destas potências torna-se, praticamente, o responsável pela implantação e organização da religião católica nas terras conquistadas. Situa-se, aqui, o famoso "padroado" (tutela do poder civil sobre a Igreja, a partir de concessões feitas pelo próprio Pontífice Romano) com suas graves conseqüências para o desenvolvimento do cristianismo. A espada e a Cruz, intimamente ligadas entre si, se lançam à "dilatação do Reino", fato esse que deixou profundas marcas no cristianismo do nosso continente. A religião cristã penetrou na alma do povo e deu origem a uma vivência popular da fé, que se conservou intacta mesmo sem a presença constante da Igreja oficial através de seus ministros ordenados. Por outro lado, a religião, muitas vezes, foi manipulada pelos poderes públicos em seu próprio benefício, tornando-se um instrumento para manter sob seu controle as massas populares. Assim, o vigor evangélico e transformador do catolicismo em terras americanas não pôde sempre atuar livremente.
6. Fé cristã e consciência missionária
O século XIX caracteriza-se por uma constante tensão entre Igreja e sociedade ocidental. Pode dizer-se que havia mesmo, entre ambas, uma ruptura que veio sendo preparada já desde os séculos XVI (Renascimento e Humanismo) e XVIII (Racionalismo). Mas é nesta mesma época que assistimos a um impulso missionário sem precedentes na história do cristianismo. São fundadas numerosas congregações religiosas, que se dedicam, quase com exclusividade, à evangelização fora da Europa. Importantes missões católicas abrangem imensas regiões da África e Ásia. Apresenta-se agudamente o problema da inculturação diante de uma simples imposição de modelos europeus e romanos, que não levam suficientemente em consideração os valores culturais destes povos recém-cristianizados (a questão é antiga e já provocara ardorosos combates no seio da Igreja: lembramos aqui a famosa "Guerra dos Ritos" na China, com o jesuíta Mateus Ricci, 1552-1610). A primeira metade do século XX prolonga o movimento missionário, iniciado no século precedente com novos incentivos e desafios (Pio XI). Cresce, paulatinamente, a convicção de que o Evangelho não é monopólio de nenhuma expressão cultural particular, e que os modelos europeus não são intrínsecos à apresentação da Boa Nova em outros contextos religiosos-culturais, nos quais, igualmente, encontramos "sementes do Reino". É o Concilio Vaticano II que dará novas e ousadas orientações para a ação missionária da Igreja nos tempos de hoje. "Dar a conhecer Jesus Cristo e o seu Evangelho àqueles que não os conhecem é precisamente, a partir da manhã de Pentecostes, o programa fundamental que a Igreja assumiu como algo recebido do seu fundador" (Paulo VI, Evangelli Nuntiandi, 1975).
A expansão do cristianismo em números (estimativas)
- no início do século IV, os cristãos estão difundidos no Império Romano e são 5 milhões (ou pouco mais) numa população de 50 milhões;
- no século XIII, a população da Europa (exceto a Rússia) é quase toda católica e alcança 50 milhões; os cristãos orientais (separados de Roma) são bem menos numerosos;
- na metade do século XVI (1550), temos cerca de 60 milhões de cristãos na Europa Ocidental; 15 a 20 milhões são protestantes; mais de 40 milhões, católicos;
- no início do século XX (1900), os cristãos são 558 milhões (1/3 da população mundial, que é de 1,620 bilhão); os católicos são 272 milhões (= a metade dos Cristãos);
- em 1980, a população mundial está próxima de 4,5 bilhões; os cristãos, de 1,5 bilhão; e os católicos, de 800 milhões.
Crescimento do número de católicos nos últimos 25 anos
No mundo, há 1 bilhão e 61 milhões de católicos, 300 milhões a mais do que havia 25 anos atrás. Em 1978, existiam 757 milhões de católicos. São dados da edição do Anuário Pontifício de 2003. A geografia dos números da Igreja revela que o maior número de católicos está presentes no continente americano, mas foi o africano quem mais contribuiu para o incremento dos batizados, com um crescimento de 148%. Foram registrados um significativo aumento de católicos na Ásia, América e Oceania. O último lugar, como há anos, continua reservado à Europa, que apresenta uma diminuição também no número de candidatos ao sacerdócio. Estes, em termos gerais, apresentam um leve crescimento em 2001 em relação ao ano 2000, passando de 110,5 a 112 mil. Os bispos no mundo são 4,6 mil, mais de 150 recentemente nomeados. Os sacerdotes são 400 mil, mais da metade diocesanos. No âmbito da vida consagrada, os religiosos não sacerdotes são cerca de 55 mil, as religiosas chegam a 800 mil. O setor da atividade pastoral pode contar, no mundo inteiro, com 29 mil diáconos permanentes, 31 mil membros de institutos seculares, 140 mil missionários leigos e 2,8 milhões de catequistas.

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